Era uma tela de uns 50cmx50cm. Exibia clipes antigos, meados da década de noventa do mais recente imortal astro pop americano. Em projeção, Michel Jackson requebrava ferozmente. Depois seguia zumbis, e dava rosas à garotas negras com extravagantes penteados de cachos reluzentes.
Umas 200 cadeiras lotavam o auditório. Mas nem mesmo 40 pessoas sentavam nelas. No caderno de ponto, colocado numa mesa à esquerda da sala, umas 38 assinaturas. Caderno velho, capa preta, desses de atas. Riscado à caneta BIC azul, esperava que o deixassem descansar, tão logo o 50ª punho deitasse sobre sua página amassada.
Entrava-se pelos fundos, por duas portas que mais pareciam box de banheiro. Uma espécie de vidro jateado, branco, fosco. Maçaneta de puxar para baixo, comprida na horizontal. Manhã de quinta-feira. O motivo do encontro era uma assembléia geral extraordinária. Servidores do INSS.
Quando uma categoria entra em greve, não pode bater os trinta dias sem negociação. Começa-se a se cortar o ponto, reduzir salários, demissões são ameaçadas. É preciso ter um certo aval do chefe. No caso, o Governo Federal.
Daí que na reunião de Brasília que eles tiveram semana passada, conseguiram a suspensão do ponto eletrônico. E a formação de um grupo de trabalho, com gente do governo e gente da categoria. É preciso que no dia 30 de setembro estejam no papel, documentado e assinado, soluções ou contra-propostas para os desejos maiores: manter o trabalho em 30 horas por semana, seis por dia; fazer da gratificação ganha por produtividade salário real - ganhar FGTS, benefícios com ela também.
E, tá bom que na última greve de trabalho o único candidato à greve de fome não teve muito sucesso. Deve ser por isso que ele ganhou mais seis companheiros. Serão sete estômagos tão vazios quanto as carteiras de seus donos a partir de segunda-feira. "De algum jeito, precisamos sensibilizar o governo e conseguir o que pedimos. Essa é uma forma justa e demonstra força". Francismar e seus colegas acreditam nisso.
Os outros companheiros da categoria, atrasados pela chuva, chegam mais de uma hora e meia depois do combinado. MJ já tinha sido calado - no vídeo, claro -, e uns aventureiros cantavam odes à, digamos, simpatia forçada com Lula e alguns ministros.
Caderninho preenchido 50 vezes, 50 nomes, 50 bolsos esperançosos, a assembléia começou. E Roberto, que apesar de ter a mulher para pagar as contas e a faculdade da menina porque o menino estuda em universidade pública, suspira por seus 63% perdidos de salário. Quase metado do orçamento da casa. Isso, porque ele tem a mulher para pagar as contas. Dos outros 49, não sei.
quinta-feira, 16 de julho de 2009
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